No debate entre Paulo Portas e Manuela Ferreira Leite venceu a clareza da mensagem. E alguma razão.
Em princípio, os debates que juntam líderes políticos com uma mancha comum de eleitorado pela qual lutam prometem sempre mais. É uma tarefa difícil, a de gerir uma cortesia que é dada pelas semelhanças de propostas com a agressividade que é necessária para se fazer perceber as diferenças. Nesse respeito, Paulo Portas, como sound bite master que é, venceu em toda a linha, com uma ou outra excepção. Mas também é preciso dizer que este formato de debates pouco mais serve, do ponto de vista do espectador, do que apreciar a natureza humana de cada participante (leia-se: quem é que perde a cabeça primeiro, se há "sangue" ou não). Em matéria de esclarecimento real sobra pouco - mas apesar de tudo mais do que o formato "tudo ao molho" do Prós&Contras. Adiante.
Já se sabia à partida que a opção pela discrição e restrição à "política de verdade" de Manuela Ferreira Leite não funciona em televisão. Este assumido posicionamento anti-linguagem mediática (que é em si um posicionamento de estratégia mediática, mas isso fica para outro dia) torna tudo muito mais difícil para a líder do PSD. Portas é o contrário; e inicia o debate distanciando-se com clareza da mancha ideológica que poderia haver - o CDS não é um partido "supletivo" e sobretudo é "claro onde o PSD é ambíguo e diferente onde o PSD é igual ao PS". Bom ataque ao "Centrão", com a introdução do conceito de ruptura serena.
A dra. Ferreira Leite replicou bem e provavelmente com o primeiro sound bite correcto que lhe ouvi desde que foi eleita:"O nosso objectivo é que o próximo primeiro-ministro não seja José Sócrates". Bom de ouvir, directo e um pedido ímplicito ao voto do eleitorado CDS.
Depois os temas foram discutidos do modo possível: Portas a reclamar para o CDS o "voto de clarificação" ao mesmo tempo que reclamava com o alegado abuso do seu tempo, como ontem Cristiano Ronaldo fazia sempre que caía no chão: sem razão. Mas explicou as áreas em que o programa do PSD lhe parecia ambíguo sem uma resposta clara de Manuela Ferreira Leite. A líder do PSD tentou entretanto colar o programa do CDS para a redução da Taxa de Rendimento Mínimo como uma medida injusta e de direita radical. Portas não conseguiu ou não teve tempo para a contrariar.
Mas foi na questão da Justiça e Segurança - quanto a mim os pontos mais sólidos do CDS - que Portas ganhou o debate. Não chegou a Ferreira Leite lembrar a abstenção do CDS aquando das alterações ao Código Penal (que ambos responsabilizam pelo aumento de criminalidade): Portas apresentou medidas concretas e não obteve resposta.
Sobre Sócrates, a coisa foi pacífica. Mas Manuela Ferreira Leite não consegue visivelmente conviver com a espinha que o PSD tem atravessada há quase 30 anos: Alberto João Jardim. À acusação de Portas de que na Madeira existe um regime "caciquista", Ferreira Leite remeteu a "asfixia democrática" para o continente. Muito mau, se lembrarmos a extraordinária resposta a uma jornalista que lhe perguntou sobre o deputado impedido pelo PSD de entrar na Assembleia Regional: "Sobre represálias políticas não comento". Provavelmente porque não têm importância...
Enfim. Foi uma vitória técnica de Portas, mais habituado a estas andanças e com sentido claro da mensagem que tem de passar. Manuela Ferreira Leite ainda teve tempo para um name-dropping dispensável ("Eu ontem estive com a Chanceler Merkel..."), mas a sensação que deixou foi a de uma professora muito aborrecida com um aluno que sabe mais do que ela.
(também publicado aqui)